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Agrotóxico na produção de feijão estaria aumentando casos de câncer.
O deputado federal Padre João (PT/MG) denunciou, pela internet, que o uso indiscriminado de agrotóxico na produção de feijão elevou para 1260, o número de casos de câncer, em adultos e crianças, na região de Unaí, em 2011. A situação foi denunciada, também, na audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da ALMG, realizada em Belo Horizonte, dia 12 de dezembro, solicitada pelo deputado Rogério Correia (PT), que tratou, ainda, da criminalização de militantes vinculados a movimentos sociais. Ele explicou que, apesar da realidade local ser de amplo conhecimento público, o Judiciário protege empresas que usam defensivos e criminaliza os movimentos sociais. «É um fato inusitado. O feijão produzido em Unaí está envenenado e a punição recai sobre quem denuncia», indignou-se. O deputado referia-se ao Frei Gilvander Luís Moreira, que, há um ano, mantém vídeo na internet denunciando o problema, e está ameaçado de prisão.
O número de casos de câncer em adultos e crianças, motivado pelo consumo e contato com agrotóxicos, está crescendo em Unaí, cidade a 100 quilômetros de Paracatu. Em 2011, segundo dados divulgados pelo deputado federal Padre João (PT/MG), na internet, o número de casos chegou a 1260.
A gravidade da situação foi denunciada por movimentos sociais, professores e membros do Poder Judiciário, na audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de MG, dia 12 de dezembro, solicitada pelo deputado Rogério Correia (PT), que tratou, ainda, da criminalização de militantes vinculados a movimentos ambientais e sociais. De acordo com o parlamentar, o assessor de Comunicação da Comissão Pastoral da Terra, Frei Gilvander Luís Moreira, estaria sendo ameaçado de prisão por juiz local, por ter disponibilizado um vídeo na internet, que traz depoimentos sobre os efeitos dos agrotóxicos na região.
Vídeo
O deputado Rogério Correia explicou que, apesar da realidade local ser de amplo conhecimento público, o Poder Judiciário tem protegido as empresas que fazem uso dos defensivos e criminalizado os movimentos sociais. «É um fato inusitado. O feijão produzido em Unaí está envenenado e a punição recai sobre quem denuncia», indignou-se. Frei Gilvander confirmou as denúncias e apresentou o vídeo com depoimento sobre o uso de tóxicos no feijão. Ele destacou o fato de a cidade estar preparando a construção de um hospital do câncer, apesar de ter menos de 100 mil habitantes. «Nenhuma cidade no Brasil desse porte conta com um estabelecimento de saúde especializado para esse fim. É mais uma prova de que o problema é grave», reforçou.
O Jornal O Movimento tentou ouvir autoridades da Secretaria de Saúde de Unaí sobre o assunto, mas até o fechamento desta edição, a Secretaria não retornou as ligações.
Irregularidades
O assessor do deputado federal Padre João (PT-MG), Francis Guedes, afirmou que existem agrotóxicos utilizados no Brasil de modo irregular, uma vez que teriam sido autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de forma fraudulenta. Segundo o assessor, por meio de laudos preparados com assinaturas falsificadas, os defensivos foram liberados sem análise laboratorial. «O deputado Padre João lidera, na Câmara dos Deputados, uma campanha contra agrotóxicos, que pretende sensibilizar o Governo Federal, por meio dos órgãos competentes, e realizar um estudo sobre o impacto do uso desses venenos na população de Unaí e região», disse.
Vídeo relata até banhos de veneno.
No vídeo postado no You Tube ainda no final de dezembro do ano passado, o Frei Gilvander Moreira entrevista a funcionária de uma escola de Arinos, chamada apenas por Edivânia e o produtor rural, Washington Fernandes Moreira. Os dois confirmam que o feijão consumido na região exala mau cheiro ao ser retirado da embalagem. Edivânia disse que qualquer cantineira de escolas da região sabe do problema. Ela afirma que, para ser consumido pelas crianças, é preciso colocar o produto de molho de um dia para outro e, antes de cozinhá-lo, «é preciso lavar e relavar de novo».
A funcionária concorda quando padre relaciona o alto índice de casos de câncer em Unaí ao uso indiscriminado de agrotóxico no cultivo do feijão e revela que a escola está plantando seu próprio feijão para deixar de consumir o feijão fornecido pelo Programa da Merenda Escolar que, segundo ela, possui alta concentração de «veneno».
O produtor rural Washington Fernandes Moreira, por sua vez, afirma que depois que se abre o saquinho de feijão, ninguém tem coragem de cozinhar o produto por causa do mau-cheiro. Ele diz que passou a produzir feijão na sua propriedade para não consumir o feijão vendido no mercado.
Quando questionado pelo Frei do porquê de os produtores optarem por usar desfolhantes ao invés de capinar o mato no preparo da terra para o plantio do feijão, Washington responde que «é mais barato jogar veneno». O agricultor explica que um litro de veneno custa R$ 12,00 e pode ser borrifado em meio dia meio de trabalho numa roça onde seriam pagos «de 100 a 200,00 contos» para ser limpa na enxada. «Mas o veneno fica na terra», adverte Washington. O produtor ainda revela o estranho caso do banho de veneno do qual ele foi uma das vítimas. » O avião passou baixinho e deu uma borrifada na cominhonete», na qual ele e seus companheiros viajam. «Tivemos que parar para lavar o carro. Ninguém agüentava o mau-cheiro», revela. Washington conta ainda que seus companheiros de viagem também levaram banho de veneno quando andavam de moto pela região produtora de feijão. «Eles tiveram que jogar a roupa fora, lavar as motos e sentiram dor de cabeça e mau estar».
Em outro vídeo, também postado no You Tube, o deputado Padre João (PT-MG), presidente da Subcomissão de Segurança Alimentar da Câmara dos Deputados, afirma que as Universidades Federais do Mato Grosso e do Paraná, além da Fiocruz, provaram o nexo direto entre o uso do agrotóxico na produção de feijão e o aumento no número de câncer em Unaí e, para ele, é um absurdo que esta situação tenha chegado à merenda escolar. O deputado cita os 1260 casos de câncer catalogados em Unaí, em 2011, e assegura que número tão alto não é registrado em lugar nenhum do mundo. «O ministério Público tem que punir quem está envenenando o povo», afirma o deputado mineiro.
«Veneno está nas mesas das pessoas»
A professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Eliane Novato Silva, fez um relato técnico sobre os efeitos do contato com os agrotóxicos nas pessoas, especialmente em crianças. Ela garantiu que há evidências laboratoriais e teóricas de que os defensivos podem causar malefícios crônicos de curto, médio e longo prazo. Para ela, é preciso uma grande mobilização social para que essa prática seja banida da sociedade brasileira. «O veneno está na mesa das pessoas, tanto no campo quanto nas grandes cidades. Estamos consumindo produtos que já são proibidos em todo o mundo, há muito tempo, mas são permitidos no Brasil», alertou.
O membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MG, Élcio Pacheco, reforçou as palavras da professora e tratou como «genocídio» o uso de agrotóxicos no País. Para ele, é preciso que sejam criadas políticas de Estado que acabem com a situação desumana e degradante na qual vivem trabalhadores próximos às plantações. «O Poder Judiciário e o Governo Estadual são coniventes e protegem as empresas que fazem uso desse veneno contra as pessoas», criticou.
Fiscalização
O representante da Fetaemg, Rômulo Luiz Campos, também criticou a atuação do Poder Judiciário em Unaí, que ameaça frei Gilvander por ter denunciado esta realidade. Segundo ele, os órgãos públicos deveriam fiscalizar os efeitos dos agrotóxicos nos alimentos e evitar que os casos sejam recorrentes no Estado. «A população de Unaí não é a única vítima desse mal. Outras cidades sofrem com o mesmo problema. A ALMG precisa exigir que o Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) faça análises criteriosas dos alimentos que vão para as mesas das pessoas», cobrou.
O procurador de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça e Conflitos Agrários, Afonso Henrique de Miranda Teixeira, destacou, ainda, que o uso do agrotóxico está diretamente ligado à reforma agrária. De acordo com ele, não se trata apenas de repartir terra, mas também de definir novos modos de produção no campo. «E o veneno, hoje, é usado em alta quantidade e toxidade», salientou.
A defensora pública e coordenadora da Defensoria Especializada em Direitos Humanos, Coletivos e Socioambientais, Ana Cláudia Silva Alexandre, anunciou que foi aberto procedimento administrativo para averiguar o caso de Unaí, e que o problema é de saúde pública, impacta a Previdência Social e a Assistência Social.
* Matéria veiculado no Jornal O MOVIMENTO, Ano XXIII, n. 431, em Dezembro/2012.